terça-feira, 16 de agosto de 2011

A amizade verdadeira tem seu fundamento em Cristo



Texto III



No mundo grego, os amantes da sabedoria, ou seja, os filósofos, consideravam a amizade como uma virtude, ou a mãe das virtudes como diz Pitágoras; por conseguinte, só podem firmar uma amizade verdadeira pessoas que se esforçam para viver uma vida virtuosa, e a maior virtude é poder viver uma vida íntegra, santa, fazendo o bem, tendo o coração inclinado ao bem. Buscando fazer a vontade de Deus, unindo-se cada vez mais a ele. E nesta união de amor a Deus, somos levados a amar o irmão, pois senão estaríamos tomados por uma dicotomia dita por São João: “se alguém disser: amo a Deus, mas odeia o seu irmão, é um mentiroso: pois quem não ama o seu irmão, a quem vê, a Deus a quem não vê, não poderá amar”. Quando eu amo verdadeiramente a Deus, eu busco fazer com que meu amigo faça e seja envolvido por este amor, já dizia Platão: “Deus faz os amigos: Deus traz o amigo para o amigo”. Na amizade percebe-se um pouco do mistério de Deus, a amizade vai dizer Anselm Grün não se pode fabricar. Em certos momentos, os amigos não sabem como tal amizade foi iniciada, existe um mistério que paira sobre a amizade, de modo que de repente ela está aí, na pedagogia do divino nada em nossa vida acontece por acaso, a providência de Deus vem sempre em nosso auxílio. De uma amizade que de repente surge, uma coisa fica clara, Deus abriu as portas do meu coração exatamente para esta pessoa.
            Quando acolhemos com amor esta pessoa em nosso coração, nós deveremos envolvê-la de alegria, e de uma vida feliz, o meu interior estando bem, eu levo o outro a um estado de paz interior também, e com isso existe esta completude de almas que se envolvem na alegria do amor-doação que os faz felizes.
Está impresso no coração dos seres humanos o desejo de alcançar à felicidade, de modo que Deus chama o homem a contemplar a felicidade e o meio que ele propõe é o do amor. Deus é amor, nos cria com e por amor e no amor nos chama a viver este amor em nossa vida; esta para ser bem vivida, deve ser marcada pelo serviço, este implica em doar-se ao outro, e na via desse amor somos conduzidos à felicidade.
            Epicuro filósofo grego dizia que “o verdadeiro amigo incluía a doação da vida pelo amigo”. A amizade que nos faz irmãos deve nos levar a ser servos uns dos outros, e não há maior exemplo de servo senão Jesus Cristo, o exemplo de servidão que é também sinônimo de humildade se revela desde o nascimento de Jesus; ele o Rei se faz pobre, bate em várias portas para encontrar abrigo, acaba sendo rejeitado por inúmeras pessoas, acaba encontrando abrigo em meio aos animais, em uma manjedoura; parece de fato ilógico, para um Rei nascer em uma manjedoura, quando podia nascer em um pomposo castelo, recebendo todas as honrarias, mas logo se faz servo, pobre e humilde, só por amor; ele entra por e com amor em nossa história para nos ensinar a ser homens, ele se fez carne, assumiu a nossa condição frágil, habitou em nós, “ele sendo Deus não se apegou a ser igual em natureza a seu Pai, porém esvaziou-se de sua glória, e assumiu a condição de um escravo, fazendo-se aos homens semelhante” (Fl 2,7). Veja que amigo fiel, Deus desce das sumas alturas, para ficar conosco, para que nós nos elevemos a ele, e nos consumemos em seu amor. Para sermos amigos fieis temos que nos despojar de nosso eu, romper com o egoísmo, com o individualismo, e se dar ao outro por inteiro.
            Quando Cristo se faz escravo, logo nos recordamos e somos transportados à cena do lava-pés, a servidão do amigo que é Rei e Senhor, mas que neste momento se faz escravo, porque o gesto de lavar os pés era feito somente pelo escravo ao seu senhor. Cristo põe o avental, sinal do serviço, toma uma jarra e uma bacia, e lava os pés de seus discípulos, e diz: “Como eu vos fiz, também vós o façais” (Jo 13,15).  O exemplo que Jesus nos deixou foi este: temos que ser servos uns dos outros; a vida dos discípulos de Jesus que escutam e guardam a palavra do mestre, deve ser uma vida de amor-doação. O discípulo segue o exemplo do mestre e busca se identificar com ele, e neste caso diz Jesus: “se observais meus mandamentos, permanecereis em meu amor; para que a minha alegria esteja em vós e vossa alegria seja plena: este é o meu mandamento: amai-vos uns aos outros como eu vos amei, ninguém tem maior amor do que aquele que dá a vida por seus amigos, vós sois os meus amigos se fizerdes o que eu mando” (Jo 15,10-14).
            Eis o grande exemplo de servidão, o amigo verdadeiro se doa ao outro, para fazê-lo feliz, na adversidade está junto, ao lado, mesmo quando o amigo está triste e fica fugindo ou se escondendo da realidade, o amigo verdadeiro vai ansiosamente ao encontro dele que está perdido no lamaçal da tristeza, da dor e do sofrimento, como o Bom Pastor que vai ao encontro da ovelha perdida, até encontrá-la, e quando a encontra a põe nos ombros e a traz de volta a alegria do redil, assim é o amigo fiel. O filósofo alemão Heidgger diz: “Devemos ser pastores do ser”. O discípulo fiel ao olhar o exemplo de seu mestre e amigo fiel, busca ser pastor da vida do outro, cuidando de suas dores e sofrimentos, pois o verdadeiro amigo está ao lado do sofredor, já diz Grün: “ele o acompanha em todas as dificuldades e misérias”. Cristo como amigo fiel, agiu desta forma, carregou as nossas dores, sofrimentos, angústias, misérias e pecados em sua cruz, como sinal de amor e misericórdia.

 

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